sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

NEGÓCIOS - Marcos Molina

Em pouco mais de dez anos, o fundador do Marfrig construiu um império que fatura R$ 28 bilhões e está presente em 23 países dos cinco continentes. Em 2009, a compra da Keystone Foods o colocou como o maior fornecedor global do McDonald's
Por Ralphe Manzoni Jr.
Na recepção da sede do grupo Marfrig, em São Paulo, faço a identificação de praxe. Pego um documento e digo que vou conversar com Marcos Molina. Ao meu lado, um homem baixo e magro me interrompe:
- Vai falar com o Marquinhos? Conheço ele há muito tempo. Sou um de seus primeiros clientes e estou aqui para tratar o final do ano com ele. Vamos passar o Réveillon juntos, diz Daniel Wessel, CEO da companhia que herda o seu sobrenome.
O breve diálogo revela muito sobre Marcos Molina, fundador do frigorífico brasileiro Marfrig, um gigante de R$ 28 bilhões, 90 mil funcionários, 151 fábricas em 23 países dos cinco continentes. 

À medida que sua companhia se transforma numa das maiores empresas de alimentação do mundo, Molina cultiva relacionamentos e amizades como quando, aos 16 anos, pediu emancipação ao pai, um açougueiro em Mogi-Guaçu, interior de São Paulo. 

Sua meta era criar um negócio de distribuição de carnes. A partir daí, não parou mais. Em 2000, comprou o primeiro frigorífico em Bataguassu, Mato Grosso do Sul. Em 2010, adquiriu, por US$ 1,2 bilhão, 

o americano Keystone Foods, que atende 28 mil restaurantes e fatura US$ 6,4 bilhões, tornando-se o maior fornecedor do McDonald’s no mundo. Foi a 38a aquisição em 60 meses, no ritmo alucinante de uma a cada 45 dias. 
Depois de fechar 38 aquisições, Molina quer tirar férias, mas, para ele,
isso significa consolidar as operações e buscar sinergias



Por esse motivo, Molina foi escolhido o EMPREENDEDOR DO ANO NA INDÚSTRIA. “Agora, vamos tirar férias”, disse à DINHEIRO Molina. “Precisamos consolidar as operações e aproveitar as sinergias.” 

Molina não está planejando um período de descanso. Seus planos de crescer internacionalmente estão ainda mais ousados, após a compra da Keystone Foods. “Criamos uma plataforma de negócios sólida”, diz o executivo. 

“Era preciso ter presença mundial, diversificação em proteína e produto industrializado.” Para ele, isso tudo já foi alcançado. A expansão geográfica permitiu desvencilhar-se de barreiras tarifárias e sanitárias contra a carne brasileira. 

As diversas aquisições deram-lhe variedade de produtos: bovinos, suínos e aves. E, com a Seara, adquirida da Cargill, ele conseguiu um nome forte de produtos industrializados. 

No mundo e no Brasil Publicidade da marca Seara durante a Copa do Mundo e
assinatura do acordo setorial para proibir a compra de carne ilegal da Amazônia


Agora, chegou a hora da expansão orgânica. Um dos lances da nova jogada pôde ser observado na Copa do Mundo da África do Sul, patrocinada pelo Marfrig. No mais global dos eventos,  a empresa mostrou a marca Seara para três bilhões de consumidores, da Arábia Saudita ao Japão. A dose será repetida em 2014. “O mundo não tem uma marca global de proteínas”, afirma Molina. “Vamos fazer isso com a Seara.” 

Os produtos da Seara já são vendidos em 100 países. Aos poucos, eles vão chegar a todos os rincões do planeta. Mas Molina quer preservar as características dos locais onde atua. 

Na Argentina, por exemplo, o Marfrig é dono da marca Paty, sinônimo de hambúrguer, e as duas marcas  vão conviver. E assim será em todas as regiões onde o Marfrig tem presença. 

São dezenas de marcas: a Moy Park, linha à base de frangos da Europa, a Patagonia, de cordeiros no Chile, a Tucuarembó, de hambúrgueres no Uruguai, e a recém-adquirida Keystone Foods, nos EUA. 

No Brasil, além da Seara, a companhia é dona da Bassi, Mabella, DaGranja, Pena Branca e Palatare. Essa forte presença global colocou o Marfrig como a sexta empresa brasileira mais globalizada em 2010. 

No setor, ela só perde para o JBS-Friboi, que lidera o ranking deste ano, segundo a Fundação Dom Cabral. Mas enquanto o JBS é o maior abatedouro do mundo, o Marfrig caminha para vender produtos de maior valor agregado. Com isso, seu modelo de negócios se assemelha ao da Brasil Foods cujo faturamento superou ao comprar a Keystone Foods.   

Presença global: Compra da Keystone transformou o Marfrig no maior fornecedor do McDonald's em todo o mundo
  

Apesar de global, o Marfrig tem o DNA de seu fundador. Dono de um sotaque caipira carregado, Molina é um empreendedor diferente. Não fez faculdade, não fala inglês e não lê livros de gestão. 

Nas reuniões, não gosta que usem PowerPoint. “Sou direto e objetivo”, afirma ele. “Temos de fazer as coisas sem burocracia. O que precisa ser resolvido tem de ser resolvido e da forma certa.” 

A simplicidade é a marca do estilo Molina de administrar. E ela cativa as pessoas com quem faz negócio. “O nosso perfil é atender o cliente. Sempre foi”, diz Molina. A frase é um chavão do mundo corporativo. 

No entanto, quando questionado se seus concorrentes não fazem o mesmo, Molina responde de bate-pronto: “Será que os outros ouvem mesmo o cliente?” Molina tem os ouvidos atentos. 

Enquanto seus rivais vendiam um produto padronizado para cadeias de restaurante, ele entregava cortes sob medida. Ele também se antecipou a uma necessidade do mercado quando proibiu a compra de carne do gado criado na Região Amazônica.

Durante encontros de negócios, geralmente fica calado, ouvindo o interlocutor. “Quando ele dá a resposta, ela é definitiva”, diz Arri Coser, fundador da Fogo de Chão, tradicional rede de churrascaria que compra 80% de sua carne do Marfrig. 

“Ele resolve as coisas na hora”, diz Daniel Wessel, que recebe do Marfrig os produtos cortados e embalados para serem vendidos com sua marca. “Para ele, é sim ou não. Não existe meio-termo.” 

Os clientes têm seu celular e podem ligar a qualquer hora. “Ele nunca deixou de atender uma ligação”, diz um funcionário que trabalha diretamente com Molina. Da forma inversa, Molina liga para os clientes com frequência. 

“A primeira pergunta sempre é: Está bem servido?Precisa de alguma coisa?”, diz Coser. Apesar da fome de aquisições, Molina resistiu à tentações de entrar em novos negócios. 

Quando Eduardo Batalha trouxe a rede de fast-food Burger King ao Brasil, convidou Molina para ser seu sócio. Convite recusado. “A grande qualidade do Marcos é não perder o foco na carne”, diz Batalha, que também é pecuarista.

Toda essa informalidade não significa que o Marfrig não seja profissionalizado. Para quem tem como sócio o BNDES – dono de quase 14% da empresa – , seria impossível colocá-lo nos trilhos sem um time de primeira. 

Por isso, Molina se cerca dos melhores profissionais para aconselhá-lo. No conselho de administração estão Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central, e Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano Papel e Celulose. 

“Não tinha tempo para mais nada. Mas fui conversar com ele e fiquei impressionado com a forma como ele toca os negócios e contrata as pessoas”, conta Maciel Neto. Desde que se emancipou, Molina anota em um caderninho os nomes de todos os bons profissionais com quem se relacionou. Boa parte deles, hoje, trabalha no Marfrig. É com estilo caipira que Molina, assim como quem não quer nada, criou uma das empresas brasileiras mais internacionais.